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Prostituição na Atualidade

 

De acordo com o Dicionário de Língua Portuguesa, de António Houaiss entende-se “prostituição” como:

 

"ato ou efeito de prostituir (-se). 1. Atividade institucionalizada que visa ganhar dinheiro com a cobrança por atos sexuais e a exploração de prostitutas. 2. Meio de vida principal ou complementar de prostitutas e prostitutos. (…) 5. Vida devassa, desregrada; libertinagem (…)."

 

Prostituição é assim uma atividade comercial de prestação de serviços sexuais entre prostitutas(os) e os/as seus/suas clientes a fim de uma compensação material. Sendo uma atividade exercida por ambos os sexos, contudo ela foi e continua a ser uma atividade em que predomina o sexo feminino como vendedoras e o sexo masculino como compradores.

As razões da escolha deste tipo de vida variam entre pobreza, alternativa ao casamento, dificuldades no mercado de trabalho, procura de autonomia conjugal, financeira, gosto ou prazer no que se faz, etc.

Atualmente existem diferentes tipos de prostituição, no entanto, nem sempre é fácil distingui-los e os profissionais desta indústria podem estar inseridos em mais do que uma categoria. Existem: 1) as/os prostitutas/(os) de rua; 2) acompanhantes de luxo ou escorts ou call girls, que podem trabalhar como independentes ou para uma agência; 3) massagistas eróticas/(os); 4) prostitutas/(os) de alterne; 5) stripers/bailarinas/(os) eróticas/(os); 6) atrizes/atores e modelos pornográficos; 7) operadoras/(es) de linhas eróticas. Atendendo à grande variedade de profissionais deste meio, a expressão mais correta para os designar será “profissionais do sexo”, que, de acordo com ARNOWITZ (2014: 224), foi criada para evitar o estigma ligado à palavra “prostituta/(o)”. Todos estes profissionais atuam em diferentes meios, com diferenciados serviços e ganhos, segundo as suas necessidades e as dos clientes que os procuram, sendo ou não dependentes de terceiros e também tendo em conta as leis que regulam esta atividade no país ou cidade em que se encontram.

Os locais ou espaços utilizados para a prática da prostituição são igualmente variados desde a rua, a casas particulares, bordéis, etc.

A internet abriu portas para novas formas de prostituição, visto que é possível interagir com os trabalhadores do sexo no mundo virtual, sem que os clientes tenham de se encontrar fisicamente com estes. O sexo é vendido através de imagens, filmes e ao vivo através da webcam. A internet também possibilitou a entrada de um maior número de pessoas neste tipo de negócio. Muitos iniciaram a atividade sem qualquer tipo de experiência, e fazem-no apenas ocasionalmente. A internet possibilitou-lhes a criação de uma vida dupla e oculta, sendo alguns deles casados, pais, trabalhadores. No entanto, recorrem à prostituição amadora sem jamais revelarem aos amigos e familiares que o fazem, e devido à discrição dos encontros e dos meios utilizados, muito dificilmente serão identificados como trabalhadores deste meio.

O humorista George Carlin lançou a questão: “Sex is legal. Selling is legal. Why is selling sex illegal?”. Trata-se de uma questão pertinente quando atualmente tudo parece ter um preço, contudo, nem tudo é aceite como comercializável do ponto de vista moral. Hoje em dia, tal como explicam WONDERS & MICHALOWSKI (2001: 550), as pessoas estão constantemente a consumir, não só bens materiais, mas também outras pessoas, “via the purchase of human services, relational experiences, and sexual encounters”. No entanto, a comercialização da sexualidade é algo que ainda não é bem aceite pela maioria das pessoas, que criminaliza, penaliza e estigmatiza quem o faz. Como explica SILVA (2010: 15), a venda de serviços sexuais engloba um conjunto de problemas sociais como a saúde pública, o tráfico e a exploração de pessoas, a qualidade de vida, a degradação moral, etc. E a extensão destes problemas varia de país para país, dando origem a diferentes tipos de políticas e programas sociais que regulamentam esta atividade.

 

A luta pela legalização da prostituição pelo mundo dura já há muito anos, tendo sido bem-sucedida em alguns países, enquanto na maioria ainda não teve a repercussão necessária. Como afirma SCHOUTEN (2010: 92), a asserção de que a prostituição é a “mais velha profissão do mundo” está longe da realidade, uma vez que são raras as sociedades onde esta atividade é realmente considerada uma profissão.

Independentemente do país e das políticas existentes, a prostituta, sob qualquer uma das suas formas, é, geralmente, estigmatizada em todo o lado. Muitas vezes chamada de “puta”[1], “whore”, “putain”, “puttana”, “nutte” palavras tendencialmente ofensivas e difamatórias que transformam a mulher que tem esta profissão numa mulher marginal, pois a sua disponibilidade sexual de caráter promíscuo e o fato de se vender remetem-na para a categoria de imoral, uma mulher sem decência, reprovada pela sociedade devido aos seus comportamentos e atitudes desregrados. Provavelmente, as profissionais do sexo serão sempre vistas como marginais e um mal para a saúde pública. Um estigma permanente e um rótulo que mantêm a fronteira entre as mulheres puras e as impuras.

Notas de rodapé:

[1] Segundo o Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa, entende-se o termo “puta” como: “1. Prostituta; 2. Qualquer mulher lúbrica que se entregue à libertinagem.”

Acompanhantes de Luxo

Na atualidade, as prostitutas de luxo são denominadas de acompanhantes, escorts ou call girls – segundo o Longman Dictionary of Contemporary English, o termo “call girl” significa: “a woman prostitute who makes her arrangements by telephone.”; e “escort” refere-se a: “2. a social companion (...); 3. A man or woman who is paid to go out socially with another: an escort agency.” Segundo DITMORE (2006: 74; 144-145), estes termos surgiram associados à criação de agências de serviços de encontros. Estas agências disponibilizavam o serviço de acompanhantes, normalmente modelos, a homens que procuravam companhia para uma diversidade de eventos, como jantares, casamentos, encontros de trabalho, teatro, etc. Com o aumento da procura e da oferta, começaram a incluir também serviços sexuais.

As mulheres que prestam estes serviços têm de ter não só beleza e charme que cative e chame a atenção, mas também algumas qualidades inteletuais, de forma a poderem acompanhar os seus clientes em diversos tipos de ocasiões e de encontros. Estes homens têm normalmente posses e/ou com cargos importantes em diferentes áreas. Atualmente, os clientes das acompanhantes de luxo esperam sobretudo, como explicam LEVER & DOLNICK (2010), que elas criem a ilusão de intimidade entre ambos, sendo esta a componente principal do serviço de GFE (the girlfriend experience), muito solicitado neste meio. Ou seja, eles tentam que a sua experiência ou interação com as escorts seja menos como uma transação comercial e mais como um encontro romântico.

Quem são? Atualmente as acompanhantes de luxo, call girls ou escorts são consideradas as mulheres do topo da indústria do comércio sexual. São prostitutas na medida em que vendem serviços sexuais em troca de dinheiro, no entanto, são diferentes das restantes, tendo em conta o seu comportamento, a instrução, o uso e controle do seu corpo, os diferentes serviços prestados aos clientes e os possíveis ganhos. Por norma, são mulheres que fogem ao estereótipo de prostitutas que vendem sexo por necessidade, ou que foram violentadas ou entraram na indústria por coerção. É sua intenção evitar a identificação de prostitutas ou nomes mais difamatórios e vulgares, rótulos sociais que apenas as tentam estigmatizar, desvalorizar e insultar. Segundo COELHO (2009: 84-99), para muitas, estes rótulos são completamente ofensivos tendo em conta que não se identificam com os estereótipos deste tipo de mulheres, vendo no nome de acompanhantes um significado de maior valor. Contudo, para outras os nomes pelos quais as tratam são apenas nomes que simplesmente as identificam como marginais, e não as afetam.

Como são? Como explica COELHO (2009: 116), as acompanhantes apresentam-se como mulheres comuns, não como prostitutas. No seu dia-a-dia mantêm uma vida normal, e vestem-se de forma banal. São mães, estudantes, donas de casa, namoradas, funcionárias públicas, etc. São mulheres que mantêm uma vida completamente fora do contexto prostitucional, muitas vezes uma vida dupla. Tendo em conta o corpus de estudo selecionado, as idades das acompanhantes variam entre os dezoito e os quarenta anos, aproximadamente. Por norma, deixam a profissão quando o seu corpo deixa de corresponder às expetativas dos clientes que as procuram.

Sabemos cada vez mais sobre a experiência de mulheres deste meio, pois a sua vida tem sido objeto de estudo por parte dos mídia. Inclusive a prostituição de luxo tem sido bastante glamorizada na ficção com filmes como Pretty Woman e The Girlfriend Experience e através da série televisiva A secret diary of a call girl. De igual forma, cada vez mais mulheres do meio tentam mostrar ao mundo quem são, revelando as suas experiências em formatos diversos. E os mídia, por sua vez, tentam encontrar e expor a verdadeira identidade dos clientes da prostituição de luxo, encontrando-se entre estes muitas figuras públicas, que mesmo tendo condenado publicamente a atividade da prostituição, no entanto, em privado recorreram aos serviços destas mulheres, como aconteceu por exmplo com o do governador de Nova Iorque, Eliot Spitzer, o senador David Vitter, etc.

As acompanhantes podem trabalhar como independentes ou por conta de outrem, normalmente para agências de acompanhamento ou agências de modelo de fachada onde o verdadeiro negócio é a prostituição. Podem também trabalhar para madames ou agentes. Como explicam KOKEN et al. (2010: 205; 210) e FLOWERS (2011: 52-56), sendo qualquer um destes os seus “empregadores”, são eles que normalmente marcam os encontros entre os clientes e as acompanhantes, estabelecendo previamente o preço do serviço e o local do encontro, são também eles que fazem a investigação prévia da vida do cliente. As agências e os agentes possuem tendencialmente uma lista de clientes regulares. Os serviços das acompanhantes são anunciados em sites próprios (páginas pessoais criadas pelas escorts ou pelas agências), nas revistas, nas páginas amarelas, na televisão, etc. Estas agências tentam operar segundo a base de que oferecem companhia e socialização de alta qualidade. As agências e os agentes ficam normalmente com um lucro entre os 20% e os 60% da transação comercial.

As acompanhantes profissionais que trabalham como independentes são geralmente as que já se conseguiram estabelecer no mercado, tendo já uma clientela fixa. As acompanhantes amadoras são as que se estabeleceram por conta própria, normalmente respondendo a clientes que procuram “companhia” em sites de encontros.

Como foi referido acima, as acompanhantes são consideradas as mulheres do topo da indústria do sexo. Contudo, dentro desta categoria existe ainda um outro grupo de elite, mais restrito e envolto em secretismo. Segundo FLOWERS (2011: 58-61) e COELHO (2009: 101), neste meio, trabalham apenas mulheres que estão dentro do mundo da prostituição de luxo, mas só aquelas que pertencem a um sistema de relacionamentos muito fechado. Para serem escolhidas são referenciadas por clientes com recursos ou por outros profissionais do ramo, ou então, por pessoas influentes. Os seus clientes são muito ricos e poderosos e elas são recompensadas pelos seus serviços com lucros que podem chegar aos milhões. Estes clientes procuram na companhia destas mulheres o máximo de discrição e sigilo. As suas sessões e/ou encontros podem durar horas ou dias, sendo raro serem contratadas apenas por uma hora. Normalmente, são requisitadas para servirem de companhia em serões e eventos sociais e em viagens de trabalho e lazer. Estas mulheres não são trabalhadoras a tempo inteiro como acompanhantes. Algumas são modelos, atrizes pouco conhecidas, apresentadoras de televisão. Por norma, são mulheres muito belas, com classe, instruídas, que conhecem pessoas influentes em áreas diversas, que querem sobretudo fazer dinheiro, e/ou também progredir na carreira. Certos hotéis de luxo apresentam a determinados clientes mais abastados catálogos com mulheres deste meio. Do mesmo modo, algumas agências de modelos dão a conhecer estas acompanhantes como modelos, criando também catálogos específicos para este propósito. Tudo isto acontece num sistema muito reservado e seletivo, em moradias ou condomínios privados e com clientes muito ricos.

As acompanhantes de luxo podem trabalhar a qualquer hora do dia, tendo em conta a sua preferência. Dependendo dos clientes fixos e dos valores que cobram, quando são avultados, estas podem atender dois ou no máximo três clientes por dia, como era o caso de Brooke, ou então dar-se ao luxo de trabalhar apenas um ou dois dias por semana, como é o caso de Amanda Goff. E fazem-no nos seus apartamentos, em hotéis, podendo ou não se deslocar à residência ou a outros locais requeridos pelos clientes e podem também trabalhar em bordéis de luxo, como é o caso do bordel de Stiletto na Austrália. Este horário flexível e o fato de não terem empregadores tradicionais são outros dos fatores atrativos desta atividade.

Todas as acompanhantes seguem certos procedimentos e regras de forma a manterem a sua segurança: entrevista ao cliente antes de se conhecerem pessoalmente, por norma por email ou telefone de forma a saberem o que este pretende; estipulam valores e definem o local; sendo habitual no início do encontro receberem o dinheiro adiantado; e seguem normas de higiene básicas: pedem ao cliente que tome banho e/ou fazem uma verificação dos seus genitais de forma a detetarem algum tipo de doença; requerem o uso de preservativo nas relações; se trabalharem com alguém, podem confirmar com estes que estão em segurança, por exemplo com um telefonema. Depois de estabelecidas as regras e os limites, elas tentam dar ao cliente o que este procura. No caso de relações sexuais, o mais rapidamente possível, utilizando técnicas corporais e de linguagem que segundo COELHO (2009: 177) “poderiam ser associadas aos comportamentos e desempenhos/performances explicitadas pelos atores pornográficos”.

Para muitas das acompanhantes, o seu trabalho é encarado como uma representação, como a simulação de prazer, intimidade e afeto com o cliente, pois enquanto para os clientes muitos dos encontros sexuais têm exatamente esses significados, para as profissionais o significado é maioritariamente económico. Pagam-lhes para efetuar um serviço, pagam-lhes pelo seu corpo, ou pela sua companhia, mas não pelo seu “eu”. Para muitas das profissionais deste ramo é a barreira que criam entre a intimidade e o prazer que lhes permite fazer o que fazem. É o que define a sua atividade como um trabalho, nada mais.

 A prostituição é uma atividade na qual os intervenientes para o seu sucesso profissional necessitam de grande visibilidade social. No entanto, tendo em conta os discursos, as imagens e a censura moral que os colocam nas margens da sociedade, por demonstrarem o seu comportamento transgressor, é crucial para as acompanhantes criar uma visibilidade diferente, num sistema relativamente limitado. Como explica COELHO (2009: 36-37): “As acompanhantes constroem uma visibilidade transgressora limitada aos pequenos anúncios de jornais ou da Internet que funcionam como cartões-de-visita: neles são tornadas explícitas práticas sexuais, disponibilidades e atributos corporais.” Ou seja, por norma, a apresentação destas mulheres é feita através de anúncios em jornais, revistas especializadas ou na internet, sendo a última o meio preferencial, pois lá podem expor imagens mais explícitas e textos mais pormenorizados onde descrevem os seus atributos corporais e os serviços que estão dispostas a oferecer aos clientes. Indicam também os seus preços, a disponibilidade horária e os contatos, estando também estas informações acessíveis a um maior número de possíveis clientes.

Como explicam KOKEN et al. (2010: 213-219), a arte de se publicitar é uma das competências essenciais a desenvolver para ser bem-sucedido no trabalho de acompanhantes de luxo, em especial das independentes. Por isso, são várias as estratégias usadas nos anúncios, por parte das mulheres deste meio para maximizar os seus lucros: 1) algumas acompanhantes optam por se apresentar aos clientes com uma personalidade autêntica, ou seja, descrevem-se apenas com informações básicas, e depois falam especificamente de determinados serviços sexuais ou fantasias, como por exemplo dizendo-se especialistas na experiência de The Girlfriend Experience. Com estes anúncios elas tentam chegar aos clientes com quem normalmente teriam uma relação. 2) Outras escorts salientam sobretudo a sua educação, a inteligência, a elegância, etc. 3) Outras optam por destacar as suas preferências nas atividades sexuais e os seus atributos físicos. 4) Algumas escolhem apelar essencialmente à variedade de fantasias dos clientes, com uma seleção cuidadosa de fotografias e de informações escritas. 5) Algumas acompanhantes procuram nichos de mercados ao oferecerem serviços especializados para esses clientes, tais como serviços de dominação sexual – Bondage, Dominance, Submission and Sadomasochism, ou tantra.

O corpo das acompanhantes será a sua principal atração nos anúncios, e é o que as distingue das restantes prostitutas. Segundo COELHO (2009: 123), “Um corpo bem modelado, com nádegas proeminentes e seios grandes, caraterísticos dos corpos jovens, são mais importantes do que uma cara bonita.”, sendo o conjunto dos atrativos físicos o principal fator de sucesso de uma acompanhante. O corpo das acompanhantes é, portanto, um projeto. Normalmente estas mulheres dedicam bastante esforço a moldá-lo e algumas investem muito dinheiro em cirurgias, de forma a obterem corpos esculturais, tonificados, com curvas salientes e rostos sem imperfeições e de aparência jovem, ou seja, alteram os seus corpos num sentido fetichista. Segundo os testemunhos das acompanhantes entrevistadas por COELHO (2009: 119-124; 205-208), este é um investimento fundamental, porque o seu corpo é fonte de trabalho e rendimento. Investem também bastante dinheiro em roupas e adereços, que são os marcadores da sua sensualidade: roupas push-up, atrevidas, de marca, sapatos altos, etc. São mulheres com estilo elitista, que se tentam apresentar entre a elegância e a sensualidade.

Segundo o estudo realizado por LEVER & DOLNICK (2010), os clientes das acompanhantes são normalmente homens brancos, com bons recursos financeiros. Estes homens podem ser casados ou não, e podem ou não sentir-se sexualmente insatisfeitos. Neste estudo, a grande maioria dos clientes eram solteiros.

De acordo com MONTO (2010: 233-251), os clientes recorrem aos serviços de prostitutas por diversas razões, sendo estas também diferenciadas de acordo com a classe social e o estado civil dos indivíduos. Tendo em conta diversos estudos feitos sobre esse fenómeno, este autor revela também o resultado dos seus estudos e conclui que os homens recorrem aos serviços das prostitutas: a) por se sentirem atraídos pela natureza ilícita do encontro; b) porque procuram variedades sexuais que não conseguem obter com os seus parceiros regulares; c) porque entendem o sexo como um bem comercializável e não como um aspeto íntimo de um relacionamento; d) porque por diversas razões não querem manter relacionamentos convencionais; e) porque não têm facilidade em se envolver ou manter relações afetivas de longa duração, por timidez, por não se sentirem fisicamente atraentes, etc. De acordo com os resultados de MONTO, os homens com níveis de escolarização elevados buscam sobretudo nestes relacionamentos a excitação do sexo ilícito. Já os homens com poucos estudos revelam recorrer a prostitutas por dificuldade em conhecer mulheres de outra forma, assim como indicam também querer ter o controle durante o ato sexual. Os clientes casados procuram em especial a realização de experiências sexuais que não têm com as esposas, e os clientes solteiros justificam a sua escolha por prostitutas, maioritariamente por tentarem evitar a responsabilidade de relacionamentos convencionais, ou então por dificuldades em formar este tipo de ligações.

Como explicam LEVER & DOLNICK (2010: 199), os clientes que recorrem às acompanhantes esperam que elas criem sobretudo a ilusão de intimidade entre ambos, e que a sua experiência não seja uma simples troca comercial, mas sim a concretização de uma fantasia. Como afirma COELHO (2009: 174):

 

"O trabalho emocional é central na relação destas mulheres com os seus clientes, este trabalho passa por um processo de falsificação, manipulação e supressão dos seus próprios sentimentos, em ordem a poderem satisfazer as necessidades e desejos sexuais dos seus clientes, tendo de construir preocupação, carinho, consideração, admiração pessoal e sexual por eles. Ela deve ser (representar) tudo aquilo que o cliente deseja que ela seja. A habilidade da prostituta reside, precisamente, na capacidade de representar sensações, emoções, sentimentos, desejos e preferências genuínas em todos os cenários, parecendo que sempre viveu na fantasia do seu cliente."

 

Como explica COELHO (2009: 164-165; 168-173), são elas, no entanto, que ditam as regras e fronteiras da sua relação com os clientes. Na sua maioria não aceitam fazer o que não querem ou não gostam e muito menos colocam a sua saúde em risco. Segundo o estudo de LEVER & DOLNICK (2010: 196-197), as atividades sexuais mais solicitadas às acompanhantes eram relações vaginais e sexo oral, e uma minoria requeria também fantasias de dominação sexual. Grande número dos clientes também procurava intimidades não sexuais, tais como: massagens, conversação, carícias.

Este negócio entre as acompanhantes e os clientes torna-se normalmente um segredo para ambos. A discrição do encontro é uma proteção para a acompanhante, uma vez que é do seu interesse que a sua atividade não seja reconhecida por terceiros, mas também para o cliente, uma vez que ser reconhecido significa que pode pôr em causa a sua masculinidade e reputação, por isso, na sua maioria, elas não temem ser reconhecidas na rua pelos clientes. O entendimento entre ambos sobre os diversos fatores envolvidos nesta transação e a satisfação do cliente fazem com que normalmente se crie uma relação de confiança e às vezes de amizade entre as acompanhantes e os seus clientes. A partir do momento em que conseguem estabelecer-se como profissionais independentes, quanto menos clientes atendem, mais lucro obtêm, na medida em que os seus clientes tornam-se regulares, e normalmente são pessoas com meios financeiros, dispostos a pagar bens de luxo. Segundo o estudo realizado por LEVER & DOLNICK (2010: 194-195), grande parte das acompanhantes entrevistadas atendiam os seus clientes na privacidade e no conforto das residências dos mesmos, por norma, espaços bem agradáveis e às vezes luxuosos. Os seus encontros, por regra geral, duravam cinco ou mais horas, e muitas vezes estes encontros de longa duração incluíam almoços e jantares, e alguns clientes habituais, considerados já como “amigos”, chegavam a passar noites inteiras com as acompanhantes. Para além das quantias avultadas cobradas por hora aos clientes, as escorts também afirmaram receber prendas, tais como joias, flores, champanhe, perfumes, etc.

Porque o fazem? Segundo COELHO (2009: 181-185), algumas mulheres vêem na prática da prostituição uma forma de liberdade de expressão sexual. É o seu corpo e fazem dele o que querem, seguindo uma lógica de descoberta e experimentalismo erótico. Outras comparam esta vida às oportunidades que teriam sem os luxuosos rendimentos desta atividade. Isto transmite-lhes a noção de que fazem o que gostam e são bem pagas por isso. No entanto, para COELHO (2009: 186-187) estes são maioritariamente discursos autojustificativos:

 

"A concretização, ou enfabulação, da ideia de puta feliz: gosta do que faz, faz o que gosta e ganha dinheiro com isso. Aqui existirá uma elevada dose de discurso autojustificativo, uma racionalização que permita à própria conviver melhor com a sua vida, com aquilo que faz. Um estilo hedonista sobressai da conversa. O gosto pela vida e pela diversão noturna, os jantares e os copos com os amigos, as festas, o prazer sexual independentemente da natureza da relação – emergida da atividade prostitucional ou não. Aliás, «ter sexo por prazer, ao menos que seja a pagar!» (…)."

Nas histórias utilizadas como objeto de estudo para esta investigação, a maioria das acompanhantes justifica o gosto por relações sexuais como um dos motivos da sua escolha pela atividade prostitucional. Estas mulheres não aceitam a justificação de que são imorais porque fazem sexo promiscuamente e levam dinheiro por isso, tendo em conta a prática comum da sociedade atual de manter relações promíscuas ocasionais, com a única diferença de que nem todos cobram por isso. Por exemplo, como explicou Brooke numa das suas entrevistas: “it is all right if someone goes home with someone that they don´t know and have sex for free. It is not all right if there is a third part involved to make sure that fellow is ok and there is some money involved.”

O dinheiro é, contudo, a principal motivação das mulheres que optam por esta atividade. As razões podem ser as mais variadas: desemprego; dívidas; necessidade de dinheiro extra ou da garantia de estabilidade económica; necessidade de assegurar uma vida mais glamorosa, no consumo de bens de luxo, tais como viagens, roupas e acessórios de marca, etc.; seja porque a prática da atividade é apenas uma situação temporária para alcançar determinados fins, como por exemplo pagar os estudos, etc. Em suma, todas elas vêem na prática da prostituição uma fonte de rendimento suplementar ou necessária para a sobrevivência. É o que parece demonstrar o caso de algumas das acompanhantes deste estudo, segundo os testemunhos reunidos por COELHO (2009: 71-77): Ana ingressou no mundo das acompanhantes pelo dinheiro, que utiliza como forma de viver com autonomia; Joana entrou na indústria para conseguir dinheiro que lhe permitisse viver e comprar tudo aquilo que sempre sonhou; Leonor começou na atividade porque tinha dívidas, e o dinheiro que recebe, maioritariamente, serve para manter o seu estilo de vida consumista; Marta procurava dinheiro extra de forma a poder alcançar o seu processo de autonomia; Carla encontrava-se no desemprego, sem estabilidade económica, e o dinheiro da prostituição permite-lhe manter o seu estilo de vida e pagar encargos financeiros; Natasha encontrava-se em situação de precariedade económica fora do país de origem, logo o dinheiro da profissão é visto numa lógica de poupança para poder voltar a casa com alguma estabilidade; Isabel, apesar da sua situação estável, ingressou na profissão com o objetivo de melhorar economicamente a sua vida e poder poupar para o futuro. Segundo os testemunhos de Brooke Magnanti e “Laura D.” estas entraram no mundo da prostituição porque se mudaram de cidade para estudar e viam nesta atividade uma forma de ganhar dinheiro para concluírem os estudos. Por outro lado, segundo os testemunhos de Amanda Goff, ela escolheu esta profissão, porque queria ser paga por algo que fazia gratuitamente.

Segundo COELHO (2009: 187), o dinheiro é, contudo, o elemento que as identifica como prostitutas:

 

"(…) o dinheiro parece marcar a fronteira moral, entre a experimentação, a busca de prazer sexual e a prostituição. O fato de receber dinheiro confere um choque de realidade: elas também são a prostituta, não são apenas a pessoa que busca o prazer sexual. (…) O pagamento marca a entrada para um universo de desvalorização identitária, estas mulheres deixam de ser consideradas normais, passam a ser transgressoras. Na medida em que, o pagamento, a compensação económica, é uma das formas de definição da atividade prostitucional e da mulher prostituta."

 

Por esta razão, como explica COELHO (2009: 187-191: 223), muitas tentam evitar receber dinheiro em mão, preferem receber por transferência bancária, ou num envelope, ou então em bens de luxo, como por exemplo joias, roupas de marca, viagens, etc. e vêem-nos como prendas, não como pagamentos.

Quanto mais elevado for o preço que cobram pelos seus serviços, maiores serão as exigências por parte dos clientes. Tendo em conta os diversos casos analisados, os valores que cobram as mulheres que trabalham como acompanhantes em Portugal variam entre os 100€ e 250€ por hora, 950€ a 1000€ por noite, e 2000€ por dia. Estes valores que também têm em conta o local onde atendem e o serviço que prestam ao cliente.

© Tatiana Capelo, Mestrado Gestão Cultural, 2014. Prostituição de Luxo: Uma Construção Cultural

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